Por que os autores bíblicos consistentemente usam a linguagem das estrelas para descrever seres espirituais? Muitas vezes os astros do céu são usados como figuras que representam os habitantes da sala do trono divino acima dos céus, e compõem o exército dos céus. Eles habitam o reino celestial e têm autoridade debaixo de Deus.
Os Seres Celestiais em Gênesis 1
No quarto dia da narrativa de criação em Gênesis 1, Deus cria os corpos celestes, posteriormente à existência da luz, do dia e da noite. A maneira como estes são descritos em Gênesis reflete uma teologia deliberada que contrasta com as crenças de culturas vizinhas que muitas vezes divinizavam elementos astronômicos.
Disse também Deus: Haja luzeiros no firmamento dos céus, para fazerem separação entre o dia e a noite; e sejam eles para sinais, para estações, para dias e anos. Gn 1:14
- Sinais: Sabemos muito bem como as estrelas e os astros foram e continuam sendo usados para demarcar estações, dias e anos. Mas e quanto aos sinais?
A palavra hebraica para “sinal” é אוֹת (oth), que pode significar evidência, marca ou até monumento. Essa palavra se repete, por exemplo na marca que Deus colocou em Caim e até mesmo o arco-íris, ambos para indicar algum ato ou ordenança de Deus.
Os sinais apontam para algo além do que os olhos podem ver. Assim como os seres humanos foram feitos à imagem que aponta para Deus.
Deus fez os dois grandes luminares: o maior para governar o dia e o menor para governar a noite; fez também as estrelas. Gn 1:16
- Governo: Diferentemente dos animais e semelhantemente aos seres humanos, os seres celestiais receberam papéis governamentais, o que pode implicar uma realidade além da que compreendemos como corpos celestes. Apesar disso, a narrativa deixa evidente sua subordinação a Deus e característica de criação.
- Rejeição da Idolatria: Ao não nomear o sol e a lua, e ao chamá-los simplesmente de “luzeiros”, o texto de Gênesis rejeita a prática comum de divinizar esses corpos celestes. Ao enquadrar o sol e a lua como criações de Deus, Gênesis 1 indica que eles não possuem vontade própria ou poder divino, mas existem para cumprir os propósitos estabelecidos por Deus.
Todavia, ainda assim vimos uma inclinação humana, não apenas nos povos vizinhos mas, até mesmo em Israel, em se curvar diante das estrelas – atitude advertida por Deus, como vemos em Deuteronômio.
E, quando olharem para o céu e virem o sol, a lua e as estrelas, todo o exército do céu, não caiam na tentação de prostrar-se diante deles e adorá-los. O Senhor, seu Deus, os deu a todos os povos da terra. Dt 4:19
- Exército do céu: A palavra hebraica para “exército” é צָבָא (tsaba/tzavah), que tem conotação de multidões. Essa palavra é usada para exércitos de guerra, mas também para multidões de habitantes, e é usada na expressão “Senhor dos Exércitos.”
O sol, a lua e as estrelas são mencionados em várias ocasiões como parte do exército do céu, ou os “habitantes” dos céus, assim como existem os habitantes da Terra (Gn 2:1). Na maioria das vezes, tal menção está presente numa advertência à idolatria. Curiosamente, o profeta Neemias reforça a reprovação à idolatria, ao enfatizar que o exército do céu não só foi criado por Deus, mas o adora.
Só tu és Senhor, tu fizeste o céu, o céu dos céus e todo o seu exército, a terra e tudo quanto nela há, os mares e tudo quanto há neles; e tu os preservas a todos com vida, e o exército dos céus te adora. Ne 9:6
Os Seres Celestiais em outras partes da Bíblia
Essa não seria a última vez que veríamos multidões celestiais louvando. Embora em grego, o Novo Testamento também narra uma multidão da milícia celestial louvando a Deus louvando quando as boas novas do nascimento de Cristo foram anunciadas em Lc 2:13.
Essa é apenas uma das muitas vezes que vemos seres celestiais louvando a Deus.
Da mesma forma, o próprio Deus narra detalhes do ato da criação onde as estrelas cantavam:
quando as estrelas da alva, juntas, alegremente cantavam,
e rejubilavam todos os filhos de Deus? Jó 38:7
- Estrelas da manhã: Embora nem sempre escrita na mesma forma exata, a expressão “Estrela da Manhã” compartilha, em diversas passagens, elementos temáticos associados a figuras celestiais de suma importância, bem como líderes terrenos, como o rei da Babilônia ou Satanás em Isaías 14:12, e ao próprio Jesus em Apocalipse 22:16. Curiosamente, a expressão foi traduzida ao Latim como lucifer.
- Filhos de Deus: A expressão Filhos de Deus, posicionada juntamente às estrelas, indica que a realidade não vista, mas sinalizada através das estrelas, o sol e a lua, é possivelmente relacionada ao conselho divino – seres que exercem autoridade no céu e na terra.